domingo, 9 de agosto de 2009

Um beijo como herança


Sempre acontecia por volta das 7 da manhã. Estava muito longe da hora de me levantar, mais dormindo do que acordado, ouvia ao longe seus passos, um rangido da porta do guarda-roupa, o tilintar da fivela do cinto, as batidas da sola do sapato nos tacos do seu quarto...voltava a dormir para depois de alguns segundos ouvir o barulinho que mais me agradava nesta rotina matinal...o escorrer da água na pia do banheiro.

Ouvia também alguns pigarros e, se prestasse muita atenção, em meio ao silêncio da casa podia até ouvir um raspar rouco da lâmina na sua pele. Esses sons e esta rotina embalavam meu sono na parte da manhã, deixavam minha preguiça de menino ainda mais gostosa.

Continuava a escutar meus barulinhos e pegava novamente no sono e só voltava a sair da vigília quando os sons se misturavam com um aroma maravilhoso que suavemente invadia meu quarto e antes que eu me arrumasse de novo entre as cobertores Parahyba, ficava mais intenso e reconfortante.

Seus passos ficavam mais próximos, seu perfume mais presente, e eu, de olhos fechados, sem deixar que você percebesse que estava atento ao todo aquele ritual ganhava um beijo.

Você havia acabado de se arrumar para o trabalho e de se barbear. Todo dia, todas as manhãs, antes de sair de casa entrava no meu quarto e debruçado sobre minha cama me beijava para abençoar e proteger o meu dia. O cheiro da loção de barba me fazia me sentir seguro e amado. Voltava a dormir mais um pouco e amando ainda mais o meu pai.

As vezes tenho preguiça de me barbear todos os dias, mas herdei o ritual de fazer a barba pela manhã e quando me debruço sobre a Júlia e o Felipe, repito o seu gesto para abençoá-los com meu beijo, mas também para ter o senhor sempre perto de nós.

Feliz Dias dos Pais pra nós dois.

Um comentário:

  1. Também me lembro dele com frequancia...
    Tenho medo de esquecê-lo.
    Seu texto encheu meus olhos de lágrimas.
    Sheila

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